MÁSCARAS ÓBVIAS

18 julho 2006

Não nos esqueçamos, como homens da vita contemplativa [vida contemplativa], que males e infortúnios alcançaram, pelas diferentes ressonâncias da contemplatividade, os homens da vita activa [vida ativa] - em suma, que conta nos apresenta a vita activa, ao nos vangloriarmos diante dela com nossas boas ações. Primeiro: as chamadas naturezas religiosas, que pelo número predominam entre os contemplativos, e, portanto, representam sua espécie mais comum, sempre agiram de forma a tornar a vida díficil para os homens práticos e mesmo estragá-la, quando possível: obscurecer o céu, apagar o Sol, suspeitar da alegria, desvalorizar as esperanças, paralisar a mão atuante - isto souberam fazer, assim como tiveram, para épocas e sentimentos miseráveis, os seus consolos, esmolas, socorros e bênçãos. Segundo: os artistas, um tanto mais raros que os religiosos, mas ainda uma espécie freqüênte de homens da vita contemplativa, foram geralmente, como pessoas, intoleráveis, caprichosos, invejosos, violentos, querelentos: tal efeito deve ser descontado dos efeitos animadores e exaltadores de duas obras. Terceiro: os filósofos, gênero em que se acham reunidas forças religiosas e artísticas, mas de forma que ao seu lado se coloca um terceiro elemento, a dialética, o gosto em demonstrar, foram autores de males à maneira dos religiosos e artistas, e além disso causaram tédio em muitos homens com o seu pendor dialético; mas o seu número sempre foi pequeno. Quarto: os pensadores e os trabalhadores científicos; eles raramente visaram produzir efeitos, limitando-se a escavar tranqüilamente suas tocas de toupeira. Assim causaram pouco aborrecimento e mal-estar, e com freqüência, inclusive como objeto de troça e riso, sem o querer, tornaram a vida mais leve para os homens da vita activa. Enfim, a ciência tornou-se algo muito útil para todos: se, por essa utilidade, tantos predestinados à vita activa abrem hoje para si um caminho rumo à ciência, com o suor de seu rosto e não sem desassossegos e imprecações, a hoste dos pensadores e trabalhadores científicos não tem culpa nessa desventura; é "pena imposta a si mesmo".*

*Segundo nota do tradutor Henri Albert, é citação de um cântico do século XVII.

( Friedrich Nietzsche, aforismo "Determinação do valor da vita contemplativa.", do livro "Aurora")

7 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Oi, Sérgio!
Vc esteve no Poppycorn lendo o meu texto e vim retribuir a visita! :)

Gostei muito do seu blog, embora deva confessar que acho Nietzsche insuportável...rs.
Vou adicionar aqui no meus favoritos e ler mais textos com calma depois (Estou no trabalho! rs)

Abraços
Luana Muzy

6:32 AM  
Anonymous Anônimo said...

Eu acho Nietzsche insuportável, também.... por isso ele FODA....rs

11:48 AM  
Blogger Máscaras Óbvias said...

Eu não sou só do Sérgio não, eu sou de muitos e de ninguém.

11:53 AM  
Anonymous Anônimo said...

Luana, satisfação tê-la aqui.
Só p'ra lhe esclarecer, este Blog não é somente meu, mas de vários outros metidos a loucos... Ultimamente de poucos...
Ou seja, é um Blog Coletivo.
Visite-nos mais vezes, e devore os escritos e os coma com a mente comente.

Abraço.

2:41 PM  
Anonymous Anônimo said...

Como se pode ler ali logo acima, O MÁSCARAS... é uma santa prostituta nossa!

2:45 PM  
Anonymous Anônimo said...

... Prostituta velha e por vezes sem cliente...

10:37 AM  
Anonymous Anônimo said...

Sem clientes, sim; porém discordo do "velha".

2:11 PM  

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